26 Fevereiro 2014
Em contraste com tudo o que o nosso país tem de mau, os portugueses podem orgulhar-se de pequenos e grandes feitos, criados e projectados por pequenos e grandes indivíduos, com pequena ou grande repercussão, ora entre portas ora além-fronteiras. Se em termos individuais conseguimos destacar-nos em várias áreas, quando se trata de trabalho em grupo a coisa não tem corrido muito bem. Conquistámos meio mundo num esforço conjunto e fomos tremendamente bem-sucedidos em perder meio mundo, enquanto num esforço conjunto descansávamos à sombra da bananeira a gozar os louros obtidos. Depois disso, o último feito de alguma grandeza terá sido uma mega feijoada organizada com grande estilo em cima de uma ponte. O que, para um país com tão grande história, não é propriamente grande cartão-de-visita.
Há, porém, uma área na qual os portugueses têm comprovadamente dado cartas, com resultados muito relevantes, sendo vista lá fora como um modelo a seguir: a política da droga.
Por momentos largámos o habitual “fazemos assim porque eles lá fora assim fazem” e, contrariando o modelo internacional, Portugal descriminalizou a posse de drogas para consumo, a partir do ano 2000, retirando a questão da posse pessoal da esfera judicial para a esfera da saúde pública. Ao invés de definharem numa prisão, os dependentes de droga recebem tratamentos efectivos. Assistiu-se a uma queda significativa de novas infecções por VIH e de mortes relacionadas com drogas. As polícias estão agora mais focadas no tráfico de larga escala. Ao contrário do que era temido, o país não se transformou numa instância turística de droga. E a descriminalização não levou a um aumento do consumo de drogas. Pelo contrário, demonstrou-se que uma estratégia mais humana e focada na saúde pública pode resultar num mais baixo consumo, através de uma filosofia assente numa prevenção simultaneamente regular e discreta, na introdução de comissões de dissuasão, na redução de riscos e danos, no tratamento e na reintegração na sociedade. Tudo isto seguindo o objectivo de combater a doença e não os doentes.
Passados 14 anos sobre o início desta política, o exemplo português é um pequeno passo no caminho certo. A política de combate à droga seguida um pouco por todo o mundo, assinada em vários acordos e tratados internacionais, tem-se revelado um fracasso, provocando mais vítimas que a própria droga em si. O remédio tornou-se pior que a doença. Só resta um caminho: a legalização. Consegue-se enfrentando os lobbys a quem interessa um combate sem fim e sem resultados. Consegue-se planeando com pés e cabeça. Consegue-se com as pessoas certas no lugar certo. Consegue-se com coragem política.
O Uruguai já deu o primeiro passo. Portugal já mostrou que pode lá chegar. Neste caso muito especial, a droga da política que temos hoje pouco tem a ver com a bem sucedida política da droga.